SETEMBRO, O MÊS D0S SÍMBOLOS NACIONAIS
Para o grande jurista brasileiro Miguel Reale, o Patriotismo "significa
devoção ou dedicação, orientação das forças do espírito no sentido do bem-estar
nacional". Ou seja, é uma postura pessoal de identificação
e valorização da nação e de seus símbolos. Patriotismo é uma virtude
civil do indivíduo que ama seu território, o passado histórico que constituiu
sua nação, a identidade cultural de onde vive e todo seu patrimônio
construído.
Patriotismo é o sentimento de
amor e respeito à pátria, vultos históricos, riquezas naturais e patrimônio
material e imaterial e aos seus símbolos. A Constituição Federal prevê em seu
artigo 13, § 1º que são símbolos da República Federativa do Brasil a bandeira,
o hino, as armas e o selo nacional.
Destaque-se dentre as principais datas
comemorativas de setembro os dias 6 de
setembro - Dia da oficialização da letra do hino nacional, 7 de setembro - Dia da
Independência do Brasil (feriado nacional) e o 18 de setembro - Dia dos símbolos nacionais.
O Hino Nacional tem uma melodia inconfundível.
Bastam dois acordes para que se reconheça de imediato. A música comove. Nos
torneios internacionais, quando um brasileiro sobe ao pódio, a cadência épica
da melodia deixa a plateia ainda mais emocionada. A melodia vem do Império. A
marcha do Hino Nacional que o Brasil ouve hoje é a mesma que dom Pedro II ouvia
nas cerimônias oficiais. Ela foi concebida por volta de 1830, pelo maestro
Francisco Manoel da Silva.
Os versos
atuais, por sua vez, são a terceira versão a acompanhar os acordes de Manoel da
Silva. A primeira letra do Hino Nacional tratava da abdicação de dom Pedro I,
em 1831. O episódio foi decisivo por ter afastado de vez os portugueses do
Brasil e consolidado a Independência. A segunda letra veio em 1841, por ocasião
da coroação de dom Pedro II. Os versos exageravam na bajulação ao soberano.
Com
o golpe que derrubou o Império, em 1889, o novo governo logo se empenhou em
sepultar os legados monárquicos e substituí-los por símbolos nacionais
republicanos. Por isso, organizou um concurso público para escolher um novo
hino.
No
meio da competição, porém, houve uma reviravolta. Influenciado por militares e
jornalistas, o presidente Deodoro da Fonseca decidiu que o velho Hino Nacional
seria mantido — mas só a melodia, sem a letra.
Durante
as três primeiras décadas da República, o Hino Nacional foi destinado a ser
apenas ouvido, e não cantado.
Nesta
sexta-feira, faz 102 anos que isso mudou. Em 6 de setembro de 1922, o
presidente Epitácio Pessoa assinou a lei que oficializou os versos pomposos do
poeta Joaquim Osório Duque-Estrada — que começam com “Ouviram do Ipiranga as
margens plácidas” — como aqueles que devem acompanhar a melodia composta quase
um século antes por Manoel da Silva.
Duque-Estrada
compusera a letra havia muito tempo, em 1909. A partir de então, o Senado e a
Câmara dos Deputados estudaram diversos projetos de lei que buscavam
oficializá-la, mas a divergência entre os parlamentares impediu que as
propostas vingassem.
Foi
a pressão da chegada das comemorações do centenário da Independência que fez o
Congresso aprovar o projeto de lei que Epitácio Pessoa sancionaria na véspera
do Sete de Setembro de um século atrás.
o Império, só
cantores líricos conseguiam entoar a música
Ao
longo do Brasil monárquico, o Hino Nacional teve duas letras diferentes (uma de
1831 e outra de 1841), ambas acompanhando a mesma melodia triunfal que é tocada
hoje em dia. As versões do Império, no entanto, não eram feitas para a voz dos
súditos comuns. Apenas os cantores profissionais dominavam a técnica para
entoá-las.
A
razão é que os versos antigos eram bem mais curtos do que os atuais.
Experimente, no canto, substituir “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas” por
“Os bronzes da tirania” (1831) ou “Quando vens, faustoso dia” (1841). Não dá
certo. É preciso fazer um contorcionismo vocal e esticar quase todas as
sílabas.
O
Hino Nacional que o Brasil canta atualmente não exige grande talento vocal
porque cada sílaba se encaixa perfeitamente em sua respectiva nota musical. O
canto é quase intuitivo.
No
Império, o Hino Nacional só podia ser cantado nos teatros, por artistas que
dominassem a técnica de alongar os sons vocálicos e acomodar uma sílaba em mais
de uma nota. Assistir à apresentação do Hino Nacional era praticamente o mesmo
que assistir a uma ópera. Registre-se que, — A prática operística era cultivada
nas cortes de João VI, Pedro I e Pedro II. Os versos do Hino Nacional,
portanto, se adaptavam perfeitamente à estética da época -.
“Rio
de Abril”
A
primeira letra foi redigida pelo poeta e juiz Ovídio Saraiva de Carvalho, em
comemoração à abdicação de dom Pedro I, em 1831. Com a renúncia do imperador
nascido em solo português em favor de seu filho brasileiro, rompiam-se os
últimos e incômodos vínculos que ainda prendiam o Brasil a Portugal.
Os
versos do primeiro Hino Nacional eram raivosos no ataque aos portugueses. Na
música, eles apareciam como “monstros” que agiam com “tirania” e se alimentavam
de “nossas virtudes, nosso ouro”. A letra chegava a propor que o Rio de
Janeiro, a capital do Império, passasse a se chamar “Rio de Abril” — referência
a 7 de abril, a data da abdicação.
Essa
versão foi abandonada em 1841, quando um autor desconhecido compôs a segunda,
para celebrar a chegada de dom Pedro II ao trono, após uma década de Regência.
Da primeira versão, ele manteve o refrão. A nova letra exaltava exageradamente
o soberano. O poeta chamava o novo imperador de “ventura do Brasil” e dizia que
era impossível “negar de Pedro as virtudes”.
A
melodia, que o Brasil jamais abandonou, foi criada pelo maestro Francisco
Manoel da Silva. A data da composição instrumental é incerta. Os historiadores
dizem que pode ter sido em qualquer momento entre a Independência, em 1822, e a
abdicação, em 1831.
Durante
boa parte do século 19, Manoel da Silva foi a grande estrela da música
brasileira. Eclético, ele produziu de canções sacras a modinhas e lundus
(músicas cômicas com letras de duplo sentido). Foi o compositor do Hino
Nacional quem musicou o lundu A Marrequinha: “Se dançando à brasileira,
/ Quebra o corpo a iaiázinha, / Com ela brinca pulando / Sua bela marrequinha”.
Marechal Deodoro fez
concurso para trocar hino
Era
o finzinho de novembro de 1889 e os brasileiros, que ainda digeriam a expulsão
de dom Pedro II e a implantação da República, ocorridas no dia 15, passaram a
acompanhar pelos jornais uma emocionante competição nacional organizada pelo
Governo Provisório. Músicos do Brasil inteiro foram chamados para propor um
novo Hino Nacional.
Os
republicanos buscaram eliminar todos os símbolos que remetessem ao antigo
regime. A bandeira foi trocada. Ruas, escolas e até mesmo navios de guerra da
Marinha ganharam novos nomes. A Estrada de Ferro de Dom Pedro II, por exemplo,
virou Estrada de Ferro Central do Brasil.
O
concurso era apenas para a melodia. A letra já estava escolhida. Os
competidores precisariam criar um acompanhamento para os versos do poeta
Medeiros e Albuquerque que diziam “Liberdade! Liberdade! Abre as asas sobre
nós!”. O autor da letra era secretário do Ministério do Interior.
Encerradas
as inscrições, registram-se 29 composições. A grande decisão se daria em 20 de
janeiro de 1890, no Teatro Lírico, no Rio.
O
sepultamento do velho Hino Nacional, porém, encontrava resistências.
Intelectuais adeptos do positivismo (filosofia que fazia uso da ciência para
explicar o mundo), que tinham forte influência sobre o Exército e o governo,
argumentavam que a tradição era importante para definir o presente e o futuro e
não poderia ser apagada na marra.
Os
críticos musicais, por sua vez, temiam que aparecessem no concurso apenas
melodias medíocres, não condizentes com a grandeza da pátria. A maior reação
veio do crítico Oscar Guanabarino. Segundo ele, muitas das composições
inscritas eram “música de dança”, e o concurso deveria ser cancelado.
“Aqueles
hinos atestam a ignorância completa de seus autores em matéria de arte musical,
procurando apenas renome adquirido pela adoção de sua frívolas e irrisórias
melodias como hino”, escreveu.
Guanabarino
defendeu a manutenção do velho Hino Nacional, pois, segundo ele, sua melodia
representava o Brasil, e não dom Pedro II ou o Império.
“Apelamos
para o chefe do Governo Provisório: — Marechal Deodoro da Fonseca, nos campos
do Paraguai, quando, à frente das colunas inimigas, a vossa espada conquistava
os louros da vitória e as bandas militares tangiam o Hino Nacional, qual era a
ideia, o nome que acudia à vossa mente no instante indescritível do entusiasmo:
a pátria ou o imperador?”.
Em
15 de janeiro, nos festejos do segundo mês da Proclamação da República, no
Palácio Itamarati, sede da Presidência, o ministro da Guerra, Benjamin
Constant, atuou como porta-voz dos positivistas e apresentou a Deodoro os
argumentos pela conservação do Hino Nacional. Sem resistência, o presidente
deixou-se convencer.
Após
a decisão, a banda militar que se apresentava no Itamaraty pôs-se a tocar o
antigo Hino Nacional com vigor. Aos primeiros acordes, as pessoas que
acompanhavam os festejos entraram em pânico e saíram correndo. Achavam que a
música era a senha para a deflagração de um contragolpe para derrubar Deodoro e
restabelecer a Monarquia.
Era,
porém, tarde demais para cancelar o concurso que mobilizava o país. A final
ocorreria dentro de cinco dias. A solução foi manter a competição, porém
transformando a letra de Medeiros e Albuquerque e a melodia vencedora no Hino
da Proclamação da República.
No
grande dia, com Deodoro no camarote de honra do Teatro Lírico, o público e o
júri escolheram a composição do maestro Leopoldo Miguez. Logo em seguida, o
presidente assinou o decreto conservando a velha melodia como o Hino Nacional —
mas sem letra.
—
Quase foi-se o Hino Nacional. Por um triz que não o perdemos — afirmou o
senador Moraes Barros (SP) num discurso no Plenário poucos anos mais tarde, em
1895.
Maestro pressionou
adoção de “Ouviram do Ipiranga”
Em
novembro de 1906, o maestro Alberto Nepomuceno, diretor do Instituto Nacional
de Música, assistiu à cerimônia de posse do presidente Afonso Pena e notou que
cada uma das três bandas militares que se apresentaram no Palácio do Catete
tocou o Hino Nacional de uma forma diferente. As variações o incomodaram
profundamente.
Foi
então que Nepomuceno decidiu embrenhar-se pelos arquivos públicos do Rio em
busca da partitura original composta no início do Império pelo maestro
Francisco Manoel da Silva. Após encontrá-la, ele, como chefe do Instituto
Nacional de Música, proporia a norma que deveria guiar a execução instrumental.
Nepomuceno,
porém, se deu conta de que poderia ir além. Ele entendeu que era o momento de o
Hino Nacional finalmente voltar a ter letra. Desde a Proclamação da República,
em 1889, era apenas uma melodia instrumental. Alguns estados tinham letras
próprias, improvisadas pela própria população.
Segundo
o maestro, era importante para a formação cívica dos estudantes que eles
cantassem o Hino Nacional, e não apenas o escutassem sem letra. Ele convenceu
Afonso Pena a pedir ao Congresso Nacional que elaborasse e aprovasse um projeto
de lei abrindo um concurso público para a escolha dos novos versos, com um
prêmio de 2 contos de réis para o vencedor.
A
sugestão que o governo enviou ao Congresso continha um modelo de letra, para
que os poetas inscritos no concurso conhecessem a extensão esperada de cada
verso e soubessem quais deveriam ser as sílabas tônicas, garantindo o casamento
perfeito da nova letra com a velha melodia.
“Pequeno
golpe”
Para
que a ideia vingasse, Nepomuceno acionou dois amigos em 1909: o deputado e
escritor Coelho Neto (MA) e o poeta Osório Duque-Estrada. O primeiro apresentou
na Câmara uma emenda a um projeto de lei prevendo o concurso. O segundo começou
a criar o seu poema, fiel ao modelo métrico elaborado por Nepomuceno e remetido
ao Congresso pelo governo.
—
Esse hino tem sido companheiro das nossas glórias e vicissitudes e precisa ser
cantado por todos os filhos deste grande país. É um hino que canta, mas não
fala. É preciso que fale, que saiba traduzir a beleza das nossas mulheres, a
pureza do nosso céu, o ruído das nossas cascatas e a impetuosidade do nosso
amor — argumentou Coelho Neto.
O
relator do projeto, deputado Germano Hasslocher (RS), defendeu a rejeição da
emenda. Para ele, a canção nacional não pode ser escolhida por concurso, pois
seria artificial:
—
Os hinos são músicas acompanhadas de letras interpretativas do sentimento
popular. É preciso que em uma e outra haja espontaneidade, o acordo perfeito e
completo com o sentimento geral do país. Esse acordo e essa espontaneidade não
se encontram com facilidade em uma obra de encomenda. A França abriu sempre
concursos para conseguir um hino, mas A Marselhesa, que não foi feita por
encomenda, suplantou todos.
A
emenda foi rejeitada. Alberto Nepomuceno, no entanto, não se deu por vencido. O
diretor do Instituto Nacional de Música ficou tão satisfeito com o poema
escrito por Osório Duque- -Estrada (“Ouviram do Ipiranga as margens
plácidas...”) que imprimiu várias cópias dele e as enviou para escolas e
quartéis de todo o país, para que, mesmo sem ser oficial, começasse a ser
aprendida por todos.
—
Pode-se dizer que Nepomuceno deu um pequeno golpe, forçando a barra para que a
obra de Duque-Estrada caísse no gosto dos brasileiros — explica o historiador
Avelino Romero Pereira, professor da UniRio e autor do livro Música,
Sociedade e Política: Alberto Nepomuceno e a República musical (ed. UFRJ).
Em
1910, o deputado Coelho Neto apresentou uma nova emenda, dessa vez determinando
que os versos de Duque- -Estrada fossem os oficiais, uma vez que já vinham
sendo cantados pelo Brasil afora, e que, por isso, o poeta seria recompensado
com 5 contos de réis. Houve mais discussão na Câmara. Os deputados rejeitaram a
oficialização da letra, mas aprovaram o prêmio.
Vários
projetos semelhantes passaram pela Câmara e pelo Senado, sempre sendo
engavetados. A situação mudou em 1922.
1922], faltando assim, materialmente, tempo
para abrir-se um concurso com resultado satisfatório”, informa um documento que
está guardado no Arquivo do Senado e foi escrito pelos senadores naquele ano.
O
presidente Epitácio Pessoa tinha urgência porque ele havia escolhido a festa da
Independência para inaugurar o rádio no Brasil e desejava que o Hino Nacional
fosse cantado na primeira transmissão. Por isso, a Câmara e o Senado correram
para aprovar tanto a compra da letra — com o governo pagando mais 5 contos de réis
a Duque-Estrada — quanto a sua oficialização. Epitácio Pessoa sancionou a lei
em 6 de setembro, véspera do centenário.
Resumindo:
Você sabe o porquê e como foi criada a letra do
Hino Nacional?
– A partir de
um poema, elaborado no ano de 1906 pelo escritor Coelho Neto, o Hino foi
realizado em um discurso na Tribuna da Câmara dos Deputados à altura da nação
brasileira, como forma de um argumento. Essa atitude levou o Ministro da
Justiça Dr. Augusto Tavares de Lira, a decretar aberto o concurso;
– Um desafio
foi lançado para toda a comunidade – reformular a letra, da melhor forma de
adaptação a melodia proposta -, quem conseguiu realizar o desafio foi o poeta e
escritor Joaquim Osório Duque Estrada;
– No ano de
1916, a letra sofreu algumas alterações;
– Através do
Decreto nº4. 559, foi conferida a autorização ao Poder Executivo para adquirir
as propriedades dos versos no ano de 1922;
– Pelo
Decreto nº 15.671 a letra do Hino foi oficializada.
A música do Hino Nacional foi composta por Francisco Manuel da Silva em
1822, e a letra por Joaquim Osório Duque Estrada em 1909. A oficialização
da letra ocorreu durante as celebrações do centenário da Independência do
Brasil, no governo de Epitácio Pessoa.
Uma curiosidade para registro é que foi adquirida por cinco contos de réis, a propriedade
plena e definitiva da letra do hino pelo decreto n.º 4.559 de 21 de agosto de
1922, pelo então presidente Epitácio Pessoa e oficializado pela lei n.º 5.700,
de 1 de setembro de 1971.O Hino Nacional Brasileiro foi instituído pelo Decreto
171/1890, de 20 de janeiro de 1890 e sua letra oficializada pelo Decreto
15.861/1922, de 06 de setembro de 1922.
“(...) Mas se ergues da justiça
a clava forte, verás que um filho teu não foge à luta!”
- VIVA O POVO BRASILEIRO!
GILMAR CARDOSO, advogado, escritor e poeta, é
membro da Academia Mourãoense de Letras, do Centro de Letras do Paraná, da
Academia Brasileira Rotária de Letras (Abrol/Paraná) e da Academia de Cultura
de Curitiba (Accur).
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